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sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Direito de Resposta- Revista Sábado (artigo de Opinião)

A insensatez e o total desconhecimento da realidade Hospitalar Portuguesa é evidente na reportagem! Fiquem com as palavras dos Enfermeiros :

“Enviei esta carta ao Director da Revista Sábado devido a um artigo que não dignifica de todo a enfermagem, enviem para todos os colegas e façam chegar aos meios de comunicação social, eu ja fiz a minha parte. Se possivel penso que deveria ser exposto como artigo de opinião no vosso blog.

Exmo. Director da Revista Sábado Miguel Pinheiro

Assunto: Direito de Resposta

No seguimento do artigo por vós publicado na edição n.º 290, intitulado “Os melhores hospitais de 2009” (págs. 51 a 73), serve a presente carta para expressar (atrevo-me) a revolta de uma classe de profissionais de saúde, leia-se, Enfermeiros, que vêem a sua imagem e o seu desempenho profissional denegridos.

Ao longo da edição, no que toca ao ranking dos hospitais portugueses, é notória a forma como se coloca a classe médica como personagem principal e, os restantes profissionais como meros figurantes.

O jornalista Pedro Jorge Castro e o repórter fotográfico Pedro Zenkl foram, durante 24 horas, a sombra de uma chefe do Serviço de Urgência de um hospital de Lisboa…convidados ou visita proposta? Curiosa será decerto a resposta!

Várias são as passagens nos artigos que revelam insensatez e um total desconhecimento da realidade da prestação de cuidados no dia-a-dia, nomeadamente da posição da Enfermagem, o seu papel fundamental na equipa, os seus conhecimentos científicos, técnicos e humanos, bem como a estruturação da profissão, enquanto detentora de funções independentes, nada espelhadas no vosso artigo; pelo contrário, o espelhado assemelha-se a um “enxovalho” público.

Os leitores são atirados para uma realidade desfocada, uma realidade de submissão do Enfermeiro face ao Médico, através do recurso a expressões radicalistas:

“…desanca imediatamente por telefone, as enfermeiras que estão a fazer a triagem…” (pág. 55);

“…mandou recado por uma enfermeira…” (pág. 55);

“Elizabete Jorge acode de imediato. Está sozinha na enfermaria – e está em maus lençóis…” (pág. 64);

“O doutor está farto. Entre a administração de diuréticos e de nitratos o cirurgião recomenda-lhe calma…” (pág. 64);

“Elizabete entra novamente em histeria. Énio volta a adverti-la para se tranquilizar…” (pág. 65);

“ «Tudo calmo ao pé deste senhor» ordena o cirurgião.” (pág. 68).

A cobertura jornalística deste projecto, coordenado pela Escola Nacional de Saúde Pública, que assenta nos resultados dos cuidados, “…mais do que averiguar se os doentes são tratados nos serviços certos ou se organização do hospital responde de forma estruturada a um problema de saúde…” (pág. 51), não projecta para a sociedade quem está por detrás destas conquistas; se tal cobertura jornalística fosse alargada às 24 horas que os Enfermeiros passam junto do doente, a realidade descrita nas vossas páginas, com toda certeza, seria totalmente diferente.

A Enfermagem é retratada como a equipa de bastidores de uma peça dirigida pela Medicina, MAS médicos não são maestros que fazem uso sua batuta para dirigirem o trabalho dos Enfermeiros, isto é, não têm autoridade sobre o seu conteúdo funcional. Como equipa, ambos detêm funções independentes e interdependentes.

Nós, Enfermeiros, somos detentores de um curso superior – Licenciatura – formados por Escolas Superiores, a quem foram reconhecidas competências na prestação de cuidados. A nossa profissão faz uso de metodologia científica e distingue-se, por ser transversal a outras disciplinas, por conseguirmos dar resposta ao holismo do doente, e não apenas à sua componente biológica; somos um elo fundamental na cadeia do sistema de saúde, (sim, é verdade!) embora o vosso artigo caracterize (ainda que erradamente) a equipa de saúde como sendo apenas composta pelo corpo médico.

Convido-vos a uma breve análise do conteúdo funcional da nossa profissão:

· Somos os primeiros na abordagem ao doente;

· Identificamos problemas de saúde e actuamos em situação de emergência;

· Organizamos, coordenamos, executamos, supervisionamos e avaliamos as intervenções de Enfermagem aos três níveis de prevenção, ao individuo, família, grupos e comunidade;

· Decidimos sobre técnicas e meios a utilizar na prestação de cuidados de Enfermagem;

· Utilizamos técnicas próprias da profissão com vista à manutenção e recuperação das funções vitais (respiração, alimentação, eliminação, circulação, comunicação, integridade cutânea e mobilidade);

· Encaminhamos e orientamos para recursos adequados;

· Promovemos a intervenção de outros técnicos de saúde;

· Participamos na coordenação e dinamização das actividades inerentes à situação de saúde/doença, bem como na elaboração e concretização de protocolos;

· Somos responsáveis por áreas como gestão, investigação, docência, formação e acessoria;

A vossa edição enaltece os médicos pelos seus heróicos actos; eu destaco a sua conduta arrogante do alto da bata branca e, os impertinentes comentários lançados pelos jornalistas:

“ «Olhe doutora, beijei hoje uma senhora com gripe A. Acha que estou infectado? Quero a vacina!». Galhofa geral no posto de comando das urgências do Santa Maria.” (pág. 54);

Se faz jus ao seu título de médica, devia validar os medos do utente, e abster-se de juízos de valor.

“ «Com vocês duas aí a triar, isto hoje vai ser para negativos. É quase tão mau como a …» [e diz o nome de uma antiga enfermeira gozada por todo o serviço pela reputação de incompetência].” (pág. 55);

Prova escrita do enxovalho público dos Enfermeiros…

“ «Quem é que está a fazer tanto barulho? Senhores enfermeiros, não querem virar aquele senhor de lado? Parece o leão da Metro a rugir» - o barulho fez-lhe lembrar o animal que surge no início dos filmes de uma produtora de Hollywood.” (pág. 56)

Riram-se? Acharam cómico? Era algum familiar vosso? Era assim que o gostariam de ver cuidado…ou como diriam os Srs. de bata branca por vós enaltecidos: tratados? Fizeram alguma pesquisa prévia da fisiologia da dor? De como pode ser agonizante? É uma sugestão…

“Uma conversa desagradável: a filha quer saber porque é que não foi feito uma TAC ao pai, sente falta de um exame, algo palpável que confirme o diagnóstico. A chefe assume uma postura defensiva: «Expliquei-lhe três vezes na sexta-feira. Não vou discutir indicação de exames consigo. Estudei para isso, tenho 30 anos de Medicina, senão a medicina era feita por computadores.»” (pág. 56)

Felicitações pela sua larga experiência, pena que não se tenham lembrado de registar no vosso artigo a provável ansiedade que a dita filha devia sentir pela situação do pai, e a forma como isso influencia a percepção da informação que o profissional quer passar.

“ «Como é que lhe fez um exame neurológico se ele não responde nem diz nada?», insiste a filha. A médica responde: «Com a sua pergunta está a mostrar que não sabe o que é um exame neurológico» ” (pág. 56)

Duas vezes felicitações pelos 30 anos de Medicina que fizeram questão de realçar, e pela segunda vez lamento que os jornalistas não tenham realçado quem afinal tem que deter os conhecimentos, e quem está sujeito ao dever de informação…

É aqui que a ‘equipa dos bastidores’ sobe ao palco, para resolver as lacunas de informação deixadas. Com todos os seus conhecimentos científicos, os Enfermeiros esclarecem e validam a informação percebida por utentes e familiares.

Numa era em que se condenam leigos pelo uso indiscriminado de informação online, na procura de resposta para as suas dúvidas em questões de saúde (aquele palavrão dito pelo médico e que ninguém percebeu, aquela medicação que ninguém sabe o que é, como actua, os efeitos indesejados esperados, reacções a que devem estar atentos e comunicar aos serviços de saúde, os cuidados a ter face a determinada doença, vulgo, patologia, etc), seriam de enaltecer, sim, os correctos cuidados de saúde.

Ao atribuírem notoriedade a simulacros como o 3º lugar: Hospitais da Universidade de Coimbra, mais uma vez revelam a vossa ignorância no que toca à profissão de Enfermagem. Internas de Medicina a fazerem-se passar por Enfermeiras “em maus lençóis”, “em histeria”, “assustada”, que “não ajuda”, que grita “Ai doutor, e agora?” cria a revolta no seio da nossa classe.

Poderia sugerir 24 horas com Enfermeiros com cobertura dos seus cuidados, do seu desempenho, das suas competências…mas não, não queremos mediatismos, apenas ser devidamente reconhecidos e dignificados como importantes que somos, pelo que fazemos.

Mais informo que a presente carta será remetida para a Ordem dos Enfermeiros, à qual será dado conhecimento do vosso infeliz trabalho, e a qual tomará as devidas posições.

Convictos que este poderá ser o despoletar da voz da Enfermagem,

Enfermeiro Marco Veríssimo
Enfermeira Joana Santos
Enfermeiro Tiago Silva
(os despoletadores desta causa)

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